Balborinho


O balborinho , borborinho, barborinho ou belborinho é um ser mítico do folclore português. O balborinho é um redemoinho de vento que surge nas horas abertas, principalmente nas encruzilhadas dos caminhos. Dentro do balborinho vão as almas penadas de campesinos que cometeram delitos agrários, e não podem entrar no céu por estarem em dívida para com os vivos, tendo necessidade de lhes restituir o que surripiaram. 


Relatos etnográficos

Vários etnólogos e antropólogos portugueses do século XIX e XX, dos quais se destacam José Leite de Vasconcellos, Teófilo Braga, Adolfo Coelho e Pedro Tudella, recolheram um vasto rol de relatos junto de populares, de Norte a Sul de Portugal, a respeito das mais variadas críptides do folclore português, incluindo, naturalmente, o Balborinho.

Dentre desses relatos, sobressaem os seguintes:

Em várias zonas do país, no século XIX, havia a crença de que no seio dos balborinhos surgem diabos e bruxas. A forma de espaventar estes seres que provêm do balborinho, porém, variava de terra para terra.

  • Em Briteiros, a recomendação que se fazia era persignar-se, enquanto se lhes dizia a seguinte invocação: «Vai-te para quem te comeu as leiras». Acreditando-se que as palhas levantadas pelos balborinhos designam terras que foram usurpadas aos seus donos. 
  • Em Moncorvo, por sua vez, recomendava-se atirar um canivete aberto ao centro do redemoinho de vento, a fim de esmadrigar de dentro do balborinho a Feiticeira ou Bruxa, que nele se ocultava.
  • No Minho em geral há referências a esta prática de lançar uma navalha ou faca ao centro do redemoinho, identificado como balborinho, por molde a dissipá-lo.
  • Em Fafe a táctica para escorraçar os balborinhos era persignar-se, enquanto se proferia a invocação: «Credo, santo nome de Jesus!»
  • Em São Pedro do Sul usava-se uma invocação em rima:

Bolborinho do peccado
Vae-te co Santigo;
Bolborinho do demonho
Vae-te co Sant'Antonho.

  • Em Guimarães era crendice popular que em cada folha arrebatada ao vento de um balborinho ia um diabo.
  • Na Beira Alta onde lhe chamam «belborinho», descrevem-no como uma violenta rajada de vento, circunscrita a uma área exígua, capaz de arrebatar e levar consigo medas de palha inteiras, estralejando. Associa-se este inusitado fenómeno meteorológico à intervenção do diabo.
  • No Carregal do Sal, para rechaçar o belborinho, usava-se a invocação: «Penico! Caqueiro velho! Vai para o Inferno! Santo Nome de Jesus!»


Abonações literárias

Na obra «Tradições» de Adolfo Coelho, consta a seguinte passagem, alusiva ao balborinho:

"Empinando o sol, nas horas abertas, quando o grande Pan está a dormir, levanta-se ás vezes inopinadamente — de preferência nas encruzilhadas — um forte redemoinho de vento: balborinho, borborinho, berbrinho, besbrinho. N'esse caso, benzendo-nos, e depois de uma devota e benefica conjuração: Santo Nome de Jesus ! Credo ! Abrenuncio ! Vae-te para quem te comeu as leiras ! devemos seguil-o com a vista, observando onde as palhinhas e folhas acarretadas pelo vento forem cahir, na certeza que é lá que se cometteu qualquer maleficio agrario, que incumbe sanar, — está bem visto em caso que resolvamos remir a alma atormentada do malfeitor que assim nos falla e implora."

No romance gráfico português, de 1987, «Mataram-no duas vezes - A lei do Trabuco e do Punhal», de Luís Avelar e Pedro Massano, à página 9, há a representação de dois bandoleiros da quadrilha de João Brandão, do século XIX, no rescaldo da guerra civil portuguesa, a dissipar um balborinho lançando-lhe uma navalha.


Analogias mitológicas

José Leite de Vasconcellos, na sua obra «Tradições populares de Portugal», ao coligir as tradições orais populares a respeito do balborinho, faz uma analogia com outras tradições folclóricas de outras culturas, que poderão ter influído nesta superstição popular portuguesa.

Concretamente, socorre-se dos estudos do antropólogo britânico Edward Burnett Tylor, para fazer um paralelismo entre o balborinho e a crença muçulmana de que as trombas de areia (remoinhos ou tornados que se formam no deserto) se tratam de djinn em fuga. Servindo-se da mesma obra de Tylor, alude ainda aos p'hepo do Sael e ao Boungie congolês, ambos espíritos ou demónios do vento, que se manifestam sob a forma de torvelinho.

Na esteira do paralelismo traçado por José Leite de Vasconcellos, é digno de menção que Adolfo Coelho, na sua obra «Obra Etnolográfica: Festas, Costumes e Outros Materiais para uma Etnologia de Portugal», no capítulo epigrafado «As Superstições Portuguesas», ao discorrer a respeito das propriedades apotropaicas do ferro, na superstição popular portuguesa, mencionou o exemplo do balborinho, dissipado pela navalha. O que oportunou uma nova analogia, desta vez, a respeito dos felás egipícos que, à guisa da sobredita crença muçulmana, ao deparar-se com trombas de areia, também julgavam tratar-se de um djinn, pelo que para o escorraçar tinham de entoar a invocação: «Ferro, o malévolo».


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